“Escrito num livro abandonado em viagem
Venho dos lados de Beja.
Vou para o meio de Lisboa.
Não trago nada e não acharei nada.
Tenho o cansaço antecipado do que não acharei,
E a saudade do que sinto não é nem no passado nem no futuro.
Deixo escrita neste livro a imagem do meu desígnio morto:
Fui, como ervas, e não me arrancaram.”
Álvaro de Campos, 1928
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Os olhos refletem um rio. Um rio imenso, azul, intransponível, ameaçador. O rio. As lentes dos óculos estarão sujas ou o que vê é realmente o rio: unbelievable. Ergue a câmara fotográfica – os olhos agora não mais refletem o rio: eles refletem a imagem (oscilante) de um rio que passa por um emaranhado de vidros e chega inverso ao espelho que chega aos olhos. Os olhos estão fixos. E nada, nada, nada distrai-os da idéia de que olham o rio. E enquadram (e esquadrinham) o rio. Aquele clique oscilante e os olhos não mais olham rio nenhum (por exatamente 1/300 segundo). O êxtase do dever cumprido toma conta dos olhos. "C'est mettre sur la mêmem ligne de mire la tête, l'oiel et le coeur." O rio não é mais o mesmo rio - já sabia Heráclito, os olhos só descobrem agora. Que objetividade o quê! Os olhos só querem saber do seu próprio reflexo (eles são olhos egoístas). E seu reflexo é agora o rio. A prova está marcada a luz e sais de prata. Os olhos e o rio foram, isso foi. A câmara se aquieta por instantes, abraçada por mãos inquietas. Os olhos fecham-se: o que vale é a fotografia da mente.
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