Malditos são os vivos que pensam não serem governados pelos mortos. Digitem no Google: C Dm G7 C Am. 183.000 resultados. Apenas algumas alternativas que você irá encontrar de algumas das músicas que existem com essas sequências de acordes (me desculpem, estou sem trema e não sei onde achar. Mas isso não tem o mínimo problema, pois daqui a pouco nem lingüiça vai ter trema. Olha só, maldito corretor. Na lingüiça ele bota trema. Desconfiável, no mínimo.).
Quantas músicas não existem com essa combinação de acordes? E o tanto de músicas que a gente pode achar com essas letrinhas, não exatamente nessa mesma ordem?
Essas letrinhas foram escritas por um senhor bastante conhecido, há no mínimo 200 anos. O senhor Johann Sebastian Bach nasceu em 21 de março de 1685 (quase a data do meu aniversário. Pois é, fico bastante feliz com isso. Penso até que posso ser o próximo Bach, se eu continuar compondo meus fragentos de música que se juntam de forma extremamente estranha. Mas o problema é que eu teria de ter pelo menos 10 filhos, todos eles músicos). Bach, numa época bastante propensa, escreveu o 'cravo bem temperado'. E depois disso, ninguém mais sossegou.
Ninguém sabe o que é o tal do dodecafonismo. Ninguém sabe o que é o tal do modalismo. Ninguém sabe o que é o tal do serialismo. Ninguém sabe o que é a tal da música eletroacústica. Mas todos, mesmo que não saibam em conceitos o que é o tonalismo, escutam música tonal. Pode ser que as pessoas não tenham escutado música modal, pode ser que as pessoas não tenham escutado música serial, pode ser que as pesssoas não tenham escutado música eletroacústica, pode ser que as pessoas não tenham escutado música dodecafônica. Mas música tonal, todos, e eu não tenho dúvidas em afirmar isso, exatamente e completamente, todos ouviram. Que me cortem as orelhas aqueles que não ouviram música tonal. Que me cortem todos os braços e pernas aqueles que nunca ouviram música tonal.
A música tonal é chicletes. A música tonal está aí para ficar. Desde que Bach decicidiu organizar o tal do tonalismo, no tal do cravo bem temperado, nunca mais as coisas foram as mesmas. Nunca mais mesmo.
Bach inspirou tudo. Praticamente tudo. E acho que ninguém sabe disso. Pois fiquem sabendo, Bach é nosso rei. Nada de Roberto Carlos no fim do ano. Bach é o cara. O tonalismo está presente em quase tudo. Com exceção de algumas músicas do Secos e Molhados, com exceção de algumas músicas do Tom Jobim e essas coisas mais rebuscadas, acho que tudo é Bach. Tudo é tonalismo. Tonalismo simples ou tonalismo complicado, tudo acaba em um acorde principal.
As pessoas que estudam música estudam o tonalismo. Até a exaustão. Escalas das mais variadas, escalas alteradas, escalas diminutas, escalas dominantes diminutas, solfejo em todos os tons, tudo isso com a ajuda de Bach. Estudar música é estudar o que Bach propôs, alongar o que Bach propôs. Olhar para o piano é olhar para Bach. Olhar para a guitarra, para o baixo, e todos os instrumentos com casinhas separando um lugar do outro é Bach.
Nada de indianos, nada de chineses, nada de japoneses. A sensação, há muitos e muitos exaustivos anos, é Bach, a tendência da música ocidental. Eu arriscaria dizer que tudo é Bach. A indústria cultural não seria nada sem Bach. Os músicos do século XX até tentaram desbancar o tal do Sr. Bach. Algum deles conseguiu? Não. Nenhum conseguiu.
Se eu odeio Bach? De forma alguma. Poderia de maneira segura dizer que Paixão segundo São Mateus foi a obra mais maravilhosa que eu vi sendo apresentada no mundo. Do que eu estou reclamando? De nada. Absolutamente nada. O problema é que fiquei me perguntando se as pessoas realmente sabem que elas são governadas pelos mortos. Se elas sabem que, mesmo negando o passado, os reis de verdade são os reis do passado.
Ah, o que seria de Chitãzinho e Xororó, o que seria da Sandy e do Junior, o que seria da Beyoncé sem esse senhor de 323 anos?
O que seria até mesmo daqueles que negaram o tonalismo? Daqueles que dizem que o tonalismo acabou com a música? Se não se tem contra quem lutar, não há luta alguma.
O jazz, até os ramos mais complexos, são uma extensão do tonalismo. Não uma negação dele. É extremamente intelectualizado, difícil de aprender, mas vem do tonalismo. Tem um quê de tonalismo no meio daquilo tudo. O samba é tonal. O choro é tonal. Muitos rocks são tonais. Tudo tem um tom. Tudo.
Não me venham então, dizer os senhores, que são avulsos ao passado. Que o que passou, passou. Não me venham com essa hipocrisia. Todos são governados pelo que passou. O que passou continua. O que passou determina o hoje. E enquanto ninguém souber o que é o hoje, o ontem será sempre o rei. O rei de todos são os mortos. O rei da música ocidental é calvo. E provavelmente usava perucas para disfarçar.
terça-feira, 21 de outubro de 2008
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