quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Doer.

O Cazuza que me perdoe, mas eu não quero a sorte de um amor tranqüilo; tampouco com sabor de fruta mordida. Se é tranqüilo, vira rotina. Se a fruta é mordida, já não é mais novidade. Me atrai o temor do desconhecido e, como já me disseram, eu gosto mais de sentir que do que de causar dor. É ela quem te faz acordar, te deixa alerta, porque você tem que fugir da dita-cuja.

As feridas vão se abrindo ao contrário do desabrochar das flores; é algo mais corrosivo, incômodo, dá ânsia, angústia. Vão crescendo como galhos pontudos, sem direção, para todos os lados, crescendo finos, crescendo tortos, ocupando espaço, alcançando o céu. Sem folhas, só galhos. Assim vão se abrindo os buracos, carregados de botões de nada (que o nada é o que mais fere, que o tédio machuca mais que uma punhalada). E o medo, o medo de que um dia essa fome de vida acabe, que não exista mais tanto interesse por tudo quanto há no mundo que chega até a doer no peito.

Será que todas essas pessoas que a gente vê na rua ou no ônibus vivem tanto assim? Sabem, viver tanto que chega até a dar vontade de morrer? Elas vivem, certo. Mas será que choram, se dóem, e riem, e sofrem, e correm, e amam amam amam, e não dormem nunca, nem por um segundo, e quando dormem têm sonhos intranqüilos, e se angustiam, e se maravilham, e dão abraços, e se emocionam com uma nadica de coisa, e caem caem caem, e têm pequenas vitórias, e têm pequenos enormes prazeres, e falam falam falam, e ficam quietas, e querem morrer, e querer arder, e querem viver, VIVER, e querem não sair da cama, e não se reconhecem no espelho, e imaginam tudo que poderiam ter sido, e sofrem até o peito não agüentar mais, e têm saudades, e bebem, e fumam, e se estragam, se acabam, se queimam queimam queimam até não sobrar quase nada, e têm raiva, e se contradizem, e querem mudar tudo, e ai! que preguiça, e pulam da cama, e escrevem freneticamente na madrugada de um domingo para segunda, poucos minutos antes de amanhecer, mas só querem escrever, soltar tudo, sangrar tudo, mesmo que seja um texto assim medíocre como esse, mas que carregue todo o peso do seu sangue, dos seus sonhos, de tudo que perderam e que amaram, de tudo o que suaram?

Meu ser, minha alma, minha lama.

Um comentário:

Anônimo disse...

o cazuza era emo! Adorava ser exagerado porque dava amor demais pra quem não merecia (e até demais pra si mesmo) e depois não conseguia lidar com as dores que ele mesmo tinha criado e inventava essa coisa de querer amor tranquilo no embalo da rede, como se alguém no mundo fosse acatar todas as barbaridades e infantilidades dele, é como amar o espelho. Eu também penso mais como tu, que amar é se permitir as pequenas aventuras e sentimentos intensos nas pequenas partes do cotidiano, que incluem todo tipo de tristeza e alegria, através de toda a curiosidade sobre a infinidade de coisas que podemos ainda aprender nesse mundo. E é preciso correr riscos pra sentir isso. Coisa que poucos querem fazer. Viver é escolher algumas poucas coisas profundamente e aceitar perder muitas outras, todo dia.