Há aquele jornalista beberrão, de “O homem que matou o facínora”, western de John Ford, que ilustra o fato. Cito de memória: “Não sou um político, sou um jornalista. Eu faço os políticos. Eu os endeuso e depois eu os destruo. É disso que eu vivo”.
Se essa forma de pensamento entre jornalistas não é novidade nenhuma para qualquer olhar menos sonolento sobre os cadernos de política, aparentemente em alguns casos (mais raros do que gostaríamos, é fato), ela é inócua. Lula é um deles.
Em sete anos e meio os jornalões nacionais fizeram de tudo e mais um pouco para derrubar um presidente operário. Achincalharam Lula, achincalharam seus modos, xingaram-no de alcoólatra, de censor e de estuprador frustrado (ó, Pai, a que ponto chegamos?); inventaram a possibilidade de um terceiro mandato e nunca deram tanto espaço para um ex-presidente avacalhar um atual mandatário quanto deram para o senil Fernando Henrique (vários outros notórios fracassos de governo pelo menos tiveram a decência de sair de cena após os mandatos). E isso só para citar alguns casos mais crassos. Mas, ao que tudo indica, espernearam entre surdos e Lula deve encerrar seu segundo mandato com um índice de popularidade que, de tão alto, chega a ser quase inadmissível.
(Deve ter sido algo parecido que, por ocasião da reeleição de Lula, reza a lenda, levou um dos barões da mídia, numa reunião a portas fechadas, a sapatear de um lado a outro perguntando: “Onde foi que nós erramos?”)
Quando o conteúdo da mídia é tão abruptamente diferente da “febre social” há de se desconfiar que algum caroço esse angu tem.
Não se pode negar as falhas do governo nesses quase oito anos, e a própria projeção internacional brasileira (um de seus méritos) atesta que Lula foi bem diferente do que indicava em 1989, quando era um modelo recém-saído da fábrica. Sem falar que a crítica ao poder estabelecido, sem dúvida, agrega algo bastante saudável para qualquer democracia.
Mas as invariáveis e brutais críticas à Lula (incluindo aí a invenção de factóides que não renderiam nem notas de rodapé, mas que por vezes e vezes ocuparam a primeira página dias seguidos), parecem fazer parte de um recalque profundo, como se a mídia passasse a ser um mecanismo de vingança social contra um ex-retirante e operário que, com uma obstinação às raias da bíblica, ousou chegar à Presidência da República.
Sem dúvida, algo que não estava no script. Vejam só, o horror dos horrores para a classe média nacional, um presidente que não sabe falar inglês. Onde já se viu? Um nordestino, um metalúrgico aleijado em um torno mecânico, praticamente um arremedo de gente se comparado a FHC, o herdeiro das altas castas da sociologia.
Naturalmente (para eles), a elite e os jornalões sentaram e esperaram que Lula enfiasse os pés pelas mãos sozinho, mas afinal precisaram assistir apopléticos a um operário comandando um governo que, se não foi perfeito, foi sim bastante satisfatório.
Agora, em ano eleitoral, sabemos, acontecerá tudo o que Deus quiser e o Diabo permita na vida pública nacional. Se nos basearmos no que a Folha fez quando apresentou a ficha falsa de “terrorista” de Dilma, não é exagero dizer que crimes serão cometidos a propósito de barrar a sucessora de Lula. Resta-nos, a princípio, duvidar de tudo e todos, como mandava a velha máxima dos pistoleiros do oeste.
Que venha, então, a histeria.
sexta-feira, 14 de maio de 2010
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2 comentários:
só agora que fui ler.
fantástico, sandova. falou tudo.
uma coisa que me parece que o povo brasileiro ( ) traz é aquela velha esperança de eleger um santo - ou de que o eleito vire santo quando assume o cargo - e que faça milagres atrás de milagres (em outras palavras, um governo onde tudo seja bonito e limpo e correto e o melhor, sempre). não que lula tenha feito isso, e nem que não tenha, mas talvez tenha dissipado um pouco essa exigência impossível ao tratar das coisas de forma mais simples e direta (da reforma do avião até a festinha na granja).
impressiona e incomoda o fato de que até hoje alguns jornais noticiam os feitos terminando as frases com "teve êxito até agora" ou fazendo questão de reafirmar e assinar embaixo da posição "insatisfeita" dos Estados Unidos, como se deixá-los "insatisfeitos" fosse um crime contra a (nossa) nação. falando simples, dá uma tristezinha de pensar que mesmo depois de tanta coisa uma grande parcela da mídia ainda siga assim.
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